15 de março de 2013

Sobre pitacos religiosos...



Sempre questiono muito o tipo de jornalismo feito por este periódico, entretanto quero compartilhar aqui pelo Blog este artigo do colunista Reinaldo Azevedo. Preciso admitir que tenho lá minhas discordâncias com relação a algumas posições que este senhor muitas vezes (muitas mesmo, como ele escreve!) explana, mas nunca concordei tanto com ele quanto quando li essas linhas... Mesmo discordando, gosto de seu estilo de escrita e quero inclusive manifestar aqui minha pequena decepção pelo título não ter vindo com a costumeira segunda opção. Sugeriria "Minutos depois do anúncio do nome do novo papa, entrou em ação a cadeia de difamação" OU "Vinde a mim, vós todos que quereis dar pitaco numa religião da qual não fazeis parte que eu argumentarei convosco!" 

 (Segue o artigo abaixo. Ao longo do texto, inseri em parênteses e entre asteriscos algumas análises minhas.)



Minutos depois do anúncio do nome do novo papa, entrou em ação a cadeia de difamação

Mal foi anunciado o nome do novo papa, começou a circular mundo afora a acusação de que Jorge Mario Bergoglio, agora papa Francisco, teria denunciando dois jesuítas, subordinados seus, para a ditadura. Já escrevi um post a respeito. Quem espalha a história é o jornalista Horacio Verbitsky, que pertenceu ao grupo terrorista Montoneros. Ele próprio admite que deu alguns tiros, “mas sem matar ninguém”. Claro, claro! Um outro jornalista argentino o acusa de ter desviado para Cuba os US$ 60 milhões que renderam o sequestro de dois bilionários argentinos. Considerando a sua história e a de Bergoglio, é muito mais verossímil que ele tenha se metido na sujeira do sequestro — terrorista confesso — do que o agora papa se envolvido com as forças da repressão. Quando procuramos os detalhes, ficamos sabendo que o dito “jornalista respeitável” não tem uma só prova, um só indício. (*Sempre me questiono por que em matéria de fé se cobra tanto provas, fundamentos daqui e dacolá e em matéria de "fato jornalístico" se propague notícias, boatos, calúnias sem base nenhuma, tudo com o respaldo da liberdade de expressão e com a justificativa de se divulgar a informação, como se o povo tivesse o direito de ser informado, mesmo que seja "mal informado", mesmo que se dê o nome de notícia a meros pitacos.*) O ódio àquele que foi escolhido para conduzir a Igreja Católica certamente deriva de sua postura considerada “conservadora” também em política. O até ontem arcebispo de Buenos Aires repudia uma Igreja transformada em partido político.

Também começaram a circular os ataques ao papa Francisco por conta de sua censura ao casamento gay e à adoção de crianças por pares homossexuais. Aqui e ali, coma ares de indignação, quase de escândalo, lembrava-se ainda que o novo papa se opõe ao aborto, a pesquisas com embriões humanos e defende as regras de relacionamento amoroso e concepção da… Igreja Católica! Meu Deus! Para onde caminha este mundo louco, não é mesmo? Com que então os cardeais escolheram para conduzir a Igreja Católica alguém que defende os fundamentos da… Igreja Católica!?

(*Nesses dias de Conclave, li um post no twitter que dizia: "A escolha do Papa é a eleição de sindico mais superestimada do mundo." E meu marido, sempre perspicaz, se perguntou: "Mas por que é que esse povo que nem mora aqui quer dar pitaco na NOSSA REUNIÃO DE CONDOMÍNIO?" Não parece óbvio!?! Ele respondeu ao post com a educação que Dona Sogra lhe deu: "É que o condomínio é muito grande!" Eu mesma continuei o debate intelecto-conjugal: Se a Igreja mudasse seus fundamentos, será que esses "pitaqueiros"  viriam para a Igreja? Duvido muito! Então para quê o pitaco?" Enfim, continuemos...*)

 Fico cá me perguntando por que, afinal, esses benfeitores da humanidade, tão convencidos de que o Vaticano é um covil de reacionários, não vão testar as suas teses progressistas em países que tiveram a ventura de não passar pela “ditadura católica” — como os muçulmanos, por exemplo. Teerã… É! Penso em Teerã, capital do Irã, cujo presidente, Mahamoud Ahmadinejad, é tão amigo dos “companheiros” brasileiros… Teerã me parece um bom lugar para essa militância, livre do, como é mesmo?, “peso do mundo judaico-cristão”…. Só tomem cuidado com os guindastes. Quando virem algumas pessoas penduradas, elas não estão trabalhando…

(*Exige-se que os cristãos tenham sempre paciência e caridade, exige-se a tolerância e o perdão, setenta vezes sete vezes, apesar de não quererem se comprometer com essas práticas! É como se dissessem: "Eu não estou obrigado a ser "bonzinho", não aderi a essa babaquice de cristianismo, mas não admito que você não seja um perfeito cristão!" Assim é fácil!... Queria ver lidar com os valores muçulmanos  como lidam com os valores judaicos-cristãos! Queria ouvir pitacos sobre Maomé serem feitos com militantes feministas descamisadas, isso eu queria ver! Na verdade, não, pois tenho certeza que não ia ficar impune...*)


“Ah, o Reinaldo acha que a gente não tem o direito de se expressar aqui mesmo; quer mandar a gente para o Irã…” Uma ova! (*"Uma ova!" rsrsrs... Muito comédia...*) Eu acho que vocês têm o direito de pedir o que lhe der na telha, mas têm também o dever de permitir que a Igreja seja Igreja (Deixa eu repetir isso: "Vocês tem o DEVER de permitir que a Igreja seja Igreja!)  — uma entidade que, embora aspire a valores universais, fala aos seus e não exerce poder de estado. Adere a ela quem quer.

(*Mais uma vez: ADERE A ELA QUEM QUER! Torcedores do Clube de Regatas Vasco da Gama: tudo bem para vocês um sócio e torcedor ser Vasco mas ir torcer no estádio com a camiseta do Clube Regatas Flamengo ( e "vice"-versa)? Brincadeiras à parte, sei que é um exemplo grotesco, mas em tempos que o esporte é a religião de muitas pessoas, talvez caiba a comparação... Faz sentido? É admissível? Meu Deus! Quer ser católico? Ninguém te obriga, mas se quiser, VESTE A CAMISA! Adira com coerência a Fé Católica, mas se você quiser: você é livre para ser ou não católico, mas não é livre para deturpar o Evangelho, a Tradição, o Magistério!*)

“Mas não tenho o direito de ser gay e ser católico”? Não se tem notícia de que a Igreja tenha expulsado de um de seus templos quem quer que seja. Também é uma mentira escandalosa que a religião promova a perseguição a este ou àquele. A instituição tem, no entanto, a sua concepção do que seja a família natural — e acho difícil que isso mude algum dia. Mas é evidente que reconhece a existência da homossexualidade e da vida em comum de parceiros homossexuais como realidade de fato. Só não aceita que tenha o mesmo status da “família natural”. Aí grita alguém: “Por quê? É inferior?” Não! É outra coisa, que a instituição não aceita como parâmetro.

Qual é o problema? Apesar da oposição da Igreja Católica da Argentina ao casamento gay e à possibilidade de adoção, a lei foi aprovada, não foi? O que me pergunto é por que não basta aos militantes da causa vencer. Por que, afinal de contas, exigem que a Igreja Católica comungue de seus mesmos valores? Fico muito impressionado que a escolha de um papa e a indicação do presidente de uma comissão do Congresso brasileiro tenham de necessariamente ser filtrados por essa pauta. Parece que a Igreja Católica, especialmente nas reportagens de TV, não tem mais nenhum desafio pela frente. Parece que aquela que é a maior instituição educacional do mundo, a maior instituição de benemerência do mundo, a maior rede de atendimento médico do mundo — só para citar alguns dos aspectos, digamos, mundanos da Igreja — agora se define por sua opinião sobre o… casamento gay! Tenham paciência!

(*Sempre digo que me parece que as pessoas envolvidas com a causa homossexual limitam demais o seu "Ser pessoa humana" a "Ser Homossexual", como se a integralidade de sua vida se resumisse à área da sexualidade. Tudo o mais fica na dependência disso e isso é tudo o que a pessoa é e representa enquanto humano, enquanto cidadão... E como disse o colunista, não basta vencer a causa em pauta, quer que se comungue com os mesmo valores! O diálogo é plural, a moral é relativa e  a tolerância é unilateral, sob pena de ser homofóbico. Não se trata apenas do "Vocês vão ter que me engolir!" do Velho Zagalo, mas "Você tem que me amar!", do Baby Sauro. Afinal: "Vocês são cristãos, estão obrigados a amar o próximo, Jesus mandou! Sua Igreja precisa aceitar! Eu? Eu não, não sou cristão, Jesus não manda em mim!" Realy?! Não se trata mais da bandeira "direitos iguais", mas de uma outra: "privilégios para as minorias"! Aristóteles proclamava:  "A verdadeira igualdade consiste em tratar-se igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida de sua desigualdade." "Na medida" não é o mesmo que "de maneira superior aos que são desiguais". Jesus proclamava (Mt 22, 21): "Dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus!" As noções de justiça se relativizam também...*)

“Reinaldo está querendo dizer que milhões de pessoas não têm importância…” Não! Estou afirmando que a pauta da Igreja Católica é outra, ora essa! Eu sei que é chato ser um tanto óbvio, mas a medida da instituição, apesar de todos os seus desvios — porque feita por homens imperfeitos — é o exemplo deixado por Jesus Cristo e as verdades reveladas (assim creem os católicos) nos Evangelhos. É uma perda de tempo, um desperdício de energia e, no fundo, uma estupidez cobrar que ela renuncie a seus fundamentos.

(*Seria o mesmo que pedir: Igreja, não seja Igreja, não se guie pelo Evangelho, dispense a Tradição e o Magistério! Igreja, você tem que se renovar! Igreja, se você não mudar, não caberá mais nesse mundo!" Ops! Conferir João 17, 9. 14-20>> http://www.bibliacatolica.com.br/biblia-ave-maria/sao-joao/17/#.UUMwNxxwrzw *)

A Igreja não abrirá mão do que considera a “família natural”; não cederá aos apelos em favor da descriminação do aborto; não acatará a destruição de embriões humanos em nome da pesquisa científica; não dará seu endosso à dissolução do casamento; não cederá, ATENÇÃO PARA ISTO!, ao pragmatismo do capitalismo, do liberalismo (e é um liberal que escreve) etc. Não fará nada disso porque o seu diálogo com o mundo moderno consiste em amparar quem sofre no… mundo moderno, mas não em ceder a seus apelos. A Igreja Católica pode beijar os pés dos que considera “pecadores”, mas não aceitará jamais o seu pecado. E essa talvez seja a dimensão mais incompreendida da instituição.

(*O que às vezes não se entende é que a Igreja, junto com a Palavra de Deus, não pode parar de clamar: "Convertam-se! E Creiam no Evangelho!" E isso é para todos: padres, casados, homossexuais, políticos, feministas... A Igreja não pode excluir (e não exclui!) ninguém, mas não pode se omitir de chamar à conversão! Se não se quiser converter, o que faz ainda na Igreja? Se não se quiser se moldar a Cristo, o que busca aqui? Vinde a mim os pequeninos! Eu vim para os pecadores e não para os justos! Mas chegando aqui, você quer continuar o mesmo? A proposta é justamente outra! Homens e mulheres novos e novas, para um mundo novo! É preciso mudar! Todos! Para melhor! O parâmetro? Cristo! Que é o mesmo ontem, hoje e sempre! Jesus disse (Mt 16, 24): "Aquele que QUISER me seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua Cruz e me siga". Não disse: "Aquele que EU quiser que me aceite, fique do mesmo jeito que está, deite na rede com a sua coca-cola gelada e manda que eu obedeço."*)

Quando se diz que a igreja ama o pecador, mas não o pecado, não se está fazendo mero jogo de palavras. Todo homem, mesmo o mais vil, é digno de piedade, mas isso não quer dizer que possamos concordar com seus malfeitos.

Nessas horas, sempre me vem à mente o exemplo notável do advogado católico Sobral Pinto. Anticomunista ferrenho, foi advogado, não obstante, de Luiz Carlos Prestes e Harry Berger (Arthur Ewert era seu nome real), que lideraram o levante comunista de 1935. Presos, foram barbaramente torturados pelo regime getulista. Entrou para a história a estratégia de Sobral, que evocou para defendê-los a Lei de Proteção aos Animais. Sim, ele abominava o comunismo, mas isso não o fazia abominar as PESSOAS comunistas. Submetidas que estavam a um tratamento desumano, inaceitável, injusto, Sobral fez o seu trabalho de advogado e viveu na prática o mandamento de sua religião. Bem, todos sabemos o que os comunistas fizeram com os cristãos quando e onde chegaram ao poder, não é mesmo? Será que Prestes, ele mesmo, teria salvado a cabeça de Sobral Pinto? Acho que não… Findo o Estado Novo, subiu ao palanque do Getúlio que havia liderado o regime que o torturara e que mandara para a Alemanha nazista a sua mulher, Olga Benário, que era judia e estava grávida. Como Prestes conseguiu fazer aquilo? Alguns, acreditem!, chegam a admirá-lo por isso. Fez porque ele tinha uma causa que considerava mais importante: a luta contra o imperialismo. Ora, se essa luta o fazia dar as mãos a um mostro, ela também poderia fazê-lo mandar para o paredão um anjo, não é?

“Por que essa viagem, Reinaldo?” Não é viagem nenhuma, não! Só estou deixando claro que os fundamentos do catolicismo não estão e não podem estar sujeitos a certas contingências. A Igreja pode e deve ser mais célere em buscar meios que facilitem a divulgação de sua “mensagem”, da “Palavra”, mas não contem com a possibilidade de que ela se transforme numa ONG, cujo rumo seja ditado pela “minoria democrática”, esse conceito tão singular criado pela militância influente, à qual a imprensa adere gostosamente. Uma igreja é feita por seus fiéis. Nesse sentido, deve-se abrir para o povo. Mas uma religião, prestem atenção!, conduz em vez de ser conduzida.

(*Uma religião conduz em vez de ser conduzida. A uma religião se adere ou não, de acordo com a consciência e liberdade e, digo mais, no caso do cristianismo, se adere a partir de um ENCONTRO PESSOAL COM O CRISTO, seja este místico ou racional. Fora disso, tudo é pitaco, opinião, e opinião, a gente já sabe, "é igual nariz"...*)

Quem tem de se submeter à maioria democrática é o estado laico — e, ainda assim, é preciso que o  faça segundo critérios muito claros, ou o mundo regride para o estado da natureza, para a luta de todos contra todos. A Igreja não é uma democracia. E faz, para lembrar a missa, o convite para “Ceia do Senhor”.  É, insisto, um convite: “Felizes os convidados…”

(*"Convite gentil, não sei desprezar..." - cantaria o Seu Roberval lá da minha comunidade. O Papa Bento XVI, na Homilia da Missa de Abertura da V Conferência Geral do Episcopado Latinoamericano e do Caribe, em 2007 em Aparecida, afirmou algo que nunca mais saiu do meu coração: "A Igreja não faz proselitismo. Ela cresce muito mais por “atração”: como Cristo “atrai todos a si” com a força do seu amor, que culminou no sacrifício da Cruz, assim a Igreja cumpre a sua missão na medida em que, associada a Cristo, cumpre a sua obra conformando-se em espírito e concretamente com a caridade do seu Senhor." E eu sempre insisto: "Nunca falta nosso convite!" Todavia, espere-se como resposta um sim ou um não. Aqueles que aceitarem, entrem sabendo que existem os critérios, a hierarquia, as prescrições, toda uma proposta não democrática, é verdade, mas nem por isso menos digna e valorosa, menos amorosa ou solidária.*)

Na Igreja do papa Francisco, como na de Bento XVI, de João Paulo II e de outros tantos, há lugar pra todo mundo, para todos nós, com todas as nossas particularidades e imperfeições. Mas, vejam que coisa!, nem todas as ideias e as visões de mundo são aceitas também como verdades dessa Igreja.

E me ocorre agora uma questão interessante: nem todas as ideias e visões de mundo devem ser aceitas nas associações GLBTs, por exemplo. Tenho a certeza de que nem mesmo gays eventualmente contrários ao casamento gay, e eles existem, seriam considerados bem-vindos, não é? O mesmo vale para o mundo da ciência. Cientistas que se opõem à pesquisa com embriões humanos levam na testa a pecha de obscurantistas. Conheço casos. Entendo. No fim das contas, os pequenos papas de suas respectivas seitas acham inaceitável que possa existir um papa da Igreja Católica. E saem gritando “cortem-lhe a cabeça!” em nome da tolerância.

(*Enfim, é para se refletir em como a relativização do mundo de hoje chegou ao ponto de os intolerantes serem os cristãos, merecedores de cadeia por pensar assim, crer assim, viver assim, anunciar assim... A que ponto chegamos, num mundo onde a democracia se inverteu para beneficiar os ditames ditatoriais das minorias em voga em detrimento ao que pensa, sente e quer a maioria. Nelson Rodrigues afirmava que toda unanimidade é burra, e que quem pensa com a unanimidade não precisa pensar. Ora, vejam só! Quem diria que a unanimidade nos dias de hoje se faz com uma minoria de pessoas barulhentas, enquanto que os que permanecem com os valores cristãos ainda são maioria, não obstante nadem contra a maré das ideologias passageiras e/ou superficiais, hedonistas e/ou individualistas. Essa sim é verdadeiramente "a vida como ela é", aceitem ou não! Tanto é verdade que não poucas vezes ouvi um ou outro ativista dessa ou daquela causa minoritária descartarem abertamente a possibilidade de realização de referendos ou plebicitos para se conhecer o que pensa a maioria das pessoas que vivem nessa nossa pseudo-democracia tupiniquim alegando que "a maioria não pode opinar numa questão que atinge direitos de minorias". A maioria não pode opinar, mas não podemos nunca abrir mão da liberdade de expressão. A Igreja não pode crer nem anunciar, mas o diálogo deve ser plural. (???) A que ponto de disparate paradoxal chegamos... Ou, nas palavras do autor: "Para onde caminha este mundo louco?"...*)

Por Reinaldo Azevedo
Fonte: veja.abril.com.br

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