Dia 19 de Março, dia de São José
de Nazaré, esposo de Maria, pai de Jesus.
Em 1989, nosso querido São João
Paulo II nos deixou uma Exortação Apostólica, a Redemptoris Custos, em celebração ao centenário da Carta Encíclica Quamquam Pluries, de Leão XIII, sobre a
figura e a missão de São José na vida de Cristo e da Igreja.
Achei oportuno meditar um pouco
sobre essa figura singular no dia de hoje, com base na referida Exortação e nas
minhas experiências pessoais, tanto por conta da sua grande dignidade na
história da salvação e da Igreja quanto por causa da grande admiração que
devoto a ele, a quem Deus, nosso Pai, confiou os “inícios da nossa Redenção”
juntamente com a Bem-aventurada Virgem Maria (RC 31)*.
No século XIX, Pio IX declarou
José Patrono Universal da Igreja e Leão XIII justifica tal título pelo o fato de ele ser
esposo de Maria e pai putativo de Jesus e, se costumava socorrer a família de
Nazaré, também com certeza sempre cobrirá e defenderá a Igreja de Cristo.
Muitos pontos me tocam muito
nesta Exortação Apostólica de João Paulo II e destes destaco alguns. O primeiro
deles é o quesito da Fé e a consequente obediência de José. Impressiona-me a Fé
que opera pela caridade (Gal 5,6) na história deste homem. No que foi anunciado
por parte de Deus pelo anjo Gabriel, José, tanto quanto Maria acreditou e
obedeceu, só que de maneira diferente: Maria o fez falando (“Faça-se em mim
segundo a tua palavra”, cf Lc 1, 38), e Deus realizou. Mas José o fez “fazendo”
(“Despertando do sono, José fez como lhe ordenara o anjo
do Senhor e recebeu a sua esposa”, cf Mt 1, 24)! O Papa João Paulo II explica
que ele teve “uma disponibilidade de vontade, semelhante à disponibilidade de
Maria, em ordem àquilo que Deus lhe pedia por meio do seu mensageiro.” (RC 3) A
Bíblia nos diz que Maria, de fato, costumava “guardar todas as coisas
meditando-as em seu coração” (cf Lc 2, 51), mas em alguns momento, podemos
“ouvir sua voz”. Foi assim na Anunciação do Anjo, na perda do menino Jesus por ocasião da
peregrinação da Páscoa aos 12 anos, nas Bodas de Caná... José, entretanto, “não
proferiu palavra alguma”, os Evangelhos “não registram palavra alguma que ele
tenha dito” (RC 17). Em outras palavras, “o que Maria fez por ações e palavras,
como resposta a Deus na Anunciação e ao longo de sua peregrinação de fé, José simplesmente
fez,
numa expressão puríssima de obediência da fé (RC 4). Existe um
ditado que afirma: “Quem muito fala, pouco faz”. Como precisamos aprender de
José a responder a Deus fazendo, realizando, operando
de acordo com sua Vontade, guiados pelo Espírito! Falemos COM o Senhor, falemos
DO Senhor, sim, mas façamos também conforme nos pede esse mesmo Senhor, assim como São José!
Outro ponto com o qual me
identifico muito, sendo mulher como sou, é a história de amor de José e Maria.
O Papa, no tópico III (O Justo, o Esposo) faz toda uma análise da questão
conjugal desta união tão peculiar e, entre outras coisas, explica que “nas
palavras da ‘anunciação’ noturna, José escuta não apenas a verdade divina
acerca da inefável vocação da sua esposa, mas ouve novamente também a verdade
acerca da própria vocação” (RC 19). O Pontífice compara o casal
com o qual se inicia o relato bíblico (Adão e Eva) no Antigo Testamento a este
nosso casal em questão, com o qual se inicia o Novo Testamento, afirmando que o
primeiro “tinha sido a fonte do mal que inundou o mundo, enquanto o casal
formado por José e Maria constitui o vértice, do qual se expande por toda a
terra a santidade (RC7). Além de tudo, afirma que “o fato de ela ser
‘desposada’ com José está incluído no desígnio de Deus (RC 18) desde o Antigo
Testamento, “de acordo com ordens divinas bem precisas, transmitidas mediante o
ministério dos anjos. Numa hermenêutica romântica, se é que isso é possível ou
aceitável, atrevo-me a sonhar que o Senhor preparou essa história de amor,
detalhe por detalhe, segundo a sua presciência e Divina Providência, já que “na
vida de Jesus nada foi deixado ao acaso; mas nela tudo se desenrolou em
conformidade com um plano divinamente preestabelecido” (RC 8).
Isso tudo aquece os corações mais
sensíveis, tendenciosos de acreditar que existe por aí um “José” para cada
“Maria” e vice-versa, que o Senhor tem um plano de amor “preestabelecido” em
nossas vidas também, e que é só questão de tempo para que um anjo venha
“anunciar” tudo com uma música romântica ao fundo e coraçõezinhos trazidos por
pombas sobre as cabeças dos envolvidos! Ora, penso que antes de mais nada, há
que se refletir, como fez o Papa, na vocação de um e de outro.
Creio que nossa história particular nessa questão de relacionamento jamais pode
se desvincular desse entendimento. Partilho um detalhe do meu testemunho de
discernimento de namoro com meu marido Juliano. Éramos grandes amigos de grupo
jovem e, tendo ambos tido um encontro pessoal com Jesus, a questão vocacional
surgiu na vida de cada um. Eu pensava numa vida consagrada, ser “esposa de
Cristo”, consumir minha vida na Igreja. Ele se sentia atraído pela missão
sacerdotal, celebrar o milagre da consagração, anunciar aos povos as Verdades Evangélicas.
Enquanto buscávamos em oração qual seria a Vontade de Deus para nossa vida,
algo começou a nos distrair: os sentimentos que começávamos a sentir um pelo
outro! Que dilema! Cada um sofria do seu lado: “E se Deus me quiser para a sua
obra? Vou precisar abrir mão desse amor que estou sentindo? Qual é o plano de
Deus para a minha vida? Fala, Senhor! Vou para o retiro vocacional do Seminário
ou peço em namoro? Vou para o noviciado na Congregação das Irmãs ou digo que
aceito namorar? Caso ou compro uma bicicleta? O que queres de mim, Senhor?!”
Bom, no nosso caso, uma grande amiga, experiente e madura na fé, pessoa de
oração, nos aconselhou de uma maneira que nunca me esqueci. Disse ela: “Você
pode fazer a sua opção. O Senhor aceitará e abençoará seus desejos também, por
que Ele te ama. Não tenha medo, se de fato não for o que Ele escolheu para
você, você sentirá conforme for se relacionando tanto com o rapaz quanto com
Ele próprio.” Deu no que deu: nossa vocação ao matrimônio determinou
nossa história de amor. Com base nisso, eu sempre tenho um conselho
pronto para “tirar da manga” a quem me procura pedindo para orar por sua vida
afetiva (coisa rara... #sqn): antes de pedir um “José” ou uma “Maria”
em sua vida, você deve orar para discernir sua vocação! Se o que
Ele sonhou para você é a vocação do matrimônio, se a sua missão enquanto
batizado for, em primeiro plano, no seio de uma família, Ele com certeza não o
(a) deixará sem seu respectivo “José” ou “Maria”! Ore, peça o discernimento e
peça a Ele que conduza sua vocação a termo!
Mais um ponto que me chama a
atenção é a Natividade do Senhor, do qual São José em sua extrema simplicidade
foi, juntamente com Maria, o primeiro depositário da fé. A partir da Encarnação
do Filho de Deus, junto com sua esposa, ele fez a peregrinação da fé, embora
não tenha avançado até o Calvário, como ela. (RC 5) Maria é a humilde serva do
Senhor, preparada desde toda a eternidade para a missão de ser Mãe de Deus; e
José, como ensina o teólogo Orígenes, é aquele que Deus escolheu para ser o “coordenador
do nascimento do Senhor” (RC 8). José foi testemunha ocular deste nascimento que,
conforme assinala o Beato João Paulo II, autor da Exortação, “se verificou em
condições humanamente humilhantes, e foi um primeiro anúncio daquele ‘despojamento’,
no qual Cristo consentiu livremente, para a remissão dos pecados (RC 10).
Sempre me vem à cabeça a figura
de José, pobre como seus familiares e vizinhos da Aldeia de Nazaré, tendo aceitado
assumir um filho que não era fruto de seu sêmen (RC 7), apoiado na fé e
obediência a Deus (e gosto de supor que no seu amor por Maria também). Sempre
me vem à cabeça as condições em que São José conseguiu arrumar, em sua total
falta de recursos, para que a esposa tivesse o nenê. Seu coração de homem, de chefe
de família protetor, deve ter doído por aquelas circunstâncias. Mas fez o
melhor que pôde, e assistiu de camarote o anúncio dos anjos e a adoração dos pastores
e magos (RC 10), grandes mistérios que a singeleza da situação não o impediu de
vivenciar. Por meditar nisso, já há alguns anos nosso Natal aqui em casa nunca
mais comportou ostentações e desperdícios, nem muito menos o corre-corre e
consumismo que querem impor goela abaixo das famílias. A figura de José, na simplicidade
da Sagrada Família naquela gruta, não nos permite celebrar de outra forma a não
ser nesse mesmo espírito de pobreza e intimidade. Além disso, eu e meu marido,
que temos (até agora) cinco filhos, sempre louvamos muito e agradecemos a Deus a
oportunidade que Ele, em sua imensa bondade, nos concedeu de trazê-los ao mundo
em tão belas e confortáveis condições, todos eles em excelentes Hospitais,
cercados de assistência e cuidados, com enxovais e bercinhos tão mais ricos do
que as faixas e manjedoura que o Salvador teve! A simplicidade e a
ação de graças, para nós, se tornaram absolutamente indispensáveis diante dessa
contemplação da Encarnação do Verbo, sob os cuidados de São José!
Um outro ponto que quero
evidenciar é a questão do trabalho e da vida
interior de São José, comentados na Redemptoris Custos. João Paulo II, no parágrafo 22 afirma que “a
expressão quotidiana deste amor na vida da Família de Nazaré é o trabalho. José
aproximou o trabalho humano do mistério da Redenção.” Assim, dá-se uma “santificação
da vida quotidiana, no que cada pessoa deve empenhar-se, segundo o próprio
estado, e que pode ser proposta apontando para um modelo acessível a todos:
São José. Prova-se, desse modo, “que para ser bons e autênticos seguidores de
Cristo não se necessitam ‘grandes coisas’, mas requerem-se somente virtudes
comuns, humanas, simples e autênticas’. Para sermos bons e autênticos
seguidores de Cristo, mais importante é mesmo a vida interior manifestada em
nossa rotina de tarefas diárias! Segundo o Pontífice, “tudo em
José tem um clima de silêncio (embora esse silêncio se torne eloquente por sua
justiça), o que conduz ao traço de um exemplo luminoso de vida interior, que
faz mais do que fala (RC 17), como analisamos no início. O sacrifício total de
sua vida, colocando-se à margem de acordo com exigências de um servo da vinda
do Messias é um testemunho de que a vida simplesmente cumprida com compromisso
e consciência se torna diante de Deus grande missão de santificação para toda
uma existência. E assim, mais uma vez eu me identifico com São José na execução
de uma missão de serviço “nos bastidores”. Quando eu me firmei no trabalho
pastoral na Renovação Carismática Católica, como é de praxe, muitas pessoas
oravam por mim para discernir os carismas que Deus tinha me confiado, os dons e
ministérios para o serviço na assembleia do Senhor, além de ouvir de Deus
moções e diretrizes para a minha vida de uma maneira geral. Eu, por inúmeras vezes ouvi a frase: “O Senhor tem uma GRANDE OBRA para a sua vida”! Imaginava o que
significava isso: o Senhor me quer coordenadora? Consagrada? Missionária? Uma
pregadora de nível internacional? O Senhor me quer uma “Madre Tereza de Calcutá”?
Um belo dia em que eu estava num estacionamento do Setor de Autarquias Sul em
Brasília, em oração dentro do meu chevrola 79 aguardando o meu então esposo
Juliano sair do trabalho, eu perguntava a Deus: “Que grande obra é essa que as
pessoas dizem e que eu mesma sinto que o Senhor tem para a minha vida?” Então,
de dentro do meu coração, eu quase pude ouvir uma voz que me respondia: “Minha
GRANDE OBRA para você é a vida oculta da Sagrada Família de Nazaré. Você
aceita?” E eu que pensava que “grandes obras” só podiam ser grandes
exteriormente fui gradualmente percebendo que no interior da gente existe o
infinito, que no escondido existem as maiores missões, que nos bastidores
também se vive os Mistérios divinos. Assim o Senhor tem me encaminhando para um
dia-a-dia de trabalho árduo e intensa vida interior, dentro da minha
casa, cuidando da minha família, tendo como parâmetro a Virgem Maria e São José,
que “estavam quotidianamente em contato com o mistério ‘escondido desde todos
os séculos’, que ‘estabeleceu a sua morada’ sob o teto da sua casa (RC 25).
Por fim, o último ponto que
queria destacar da figura de José é a confiança que sempre tive em sua intercessão. São João Paulo II finaliza a exortação “recomendando-nos à proteção daquele a quem
o próprio Deus ‘confiou a guarda dos seus tesouros mais preciosos e maiores’.
Assim eu, desde muito pequena, aprendi a confiar-lhe meus tesouros
particulares: minha família, meu pais (Socorro e Luiz e seu matrimônio), meus
irmãos Marcos e Márcio, depois o meu namoro-noivado-casamento-família com o
Juliano. Em nossa cerimônia de casamento, as consagrações a Maria e José
tiveram seus momentos especiais. Mas um dos momentos mais marcantes que vivi com essa devoção a São José foi quando eu e o Juliano queríamos engravidar. O
testemunho nessa área é extenso, então vou resumir. Nosso primeiro filho, nós
perdemos ainda na gestação, e a partir de então, todos os médicos que
consultávamos nos dava o diagnóstico de ovários policísticos e, no meu caso,
estava afetando diretamente a minha fertilidade. Em meio a muitas orações e
tentativas, pela graça de Deus veio nossa primeira filha Clara, numa gestação e
parto sem problemas nenhum. Nossos médicos diziam que Deus tinha tido
misericórdia de nós e tinha mandado pelo menos uma filha, mas que não
fizéssemos expectativas de termos outros, já que o problema se agravava,
inclusive com outros sintomas. Eu cheguei a engravidar de novo, e perder uma outra filha em gestação. Numa ocasião, estávamos num Seminário de vida no
Espírito Santo e era justamente dia de São José. Durante a Missa de
encerramento, o Pe Lindomar proclamou durante uma oração: “Entre nós existe uma
mulher que quer engravidar, mas tem tido problemas. Minha irmã, peça a São José
que interceda por esse seu sonho!” Eu não quis nem saber se era para mim ou
para outra pessoa: tomei posse da graça, como se costuma dizer! Clamei ao Senhor e supliquei pela
intercessão do meu querido São José, e ainda fiz uma promessa: “Se eu consegui
engravidar de novo nessa vida e a criança for um menino, se chamará José”. Isso
aconteceu em Março, e no mês de Maio eu já estava grávida, era um menino, seu nome
é José e ele hoje tem 10 anos e é um menino super especial, piedoso à sua
maneira, que recentemente confidenciou que almeja ser um “padre-mergulhador” quando
crescer (coisas do Zé...). E como São José é comprovadamente um homem que não gosta de deixar compromisso assumido pela metade (Maria pode atestar!), depois do nosso José engravidamos mais três vezes (do João, do Tiago e recentemente do Paulo), como eu mencionei acima: temos, até agora, cinco filhos!
Por tudo isso, espelhemo-nos em
José, aquele que "acreditou fazendo" e, em seu trabalho silencioso e postura
simples, estabeleceu uma íntima relação com Nosso Senhor e Nossa Senhora!
Entreguemos a ele nossas necessidades e clamemos por sua intercessão:
Valei-nos, São José!
*A sigla RC se refere a
Redemptoris Custos, e o número que segue se refere ao parágrafo da mesma.
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