27 de fevereiro de 2012

Jejum, esmola e oração – Os exercícios da Quaresma




Na Quaresma, os cristãos se preparam para celebrar a Páscoa, que está no centro de todas as celebrações da Igreja e da fé cristã; com a Páscoa, comemoramos o Mistério Pascal da paixão, morte e ressurreição gloriosa de Jesus Cristo e nossa participação nesse Mistério de Cristo e da Igreja.
Durante a Quaresma somos convidados a rever nossa vida cristã, a fazer uma avaliação sobre como andamos no seguimento de Cristo e no progresso da virtudes cristãs; no final da Quaresma, na noite da Páscoa, faremos a renovação das promessas do nosso Batismo, que são os compromissos de nossa vida cristã. Devemos, pois, preparar-nos para renovar nossa adesão a Cristo, como seus discípulos missionários e amigos.
A Igreja nos indica os seguintes três exercícios quaresmais: a) o jejum - e neste conceito estão incluídas todas as formas de penitência, as escolhas e as necessárias renúncias e sacrifícios para correspondermos aos caminhos de Deus. Não existe vida cristã autêntica, sem seguir os Mandamentos de Deus e sem obedecer ao Evangelho de Cristo; e isso requer uma disciplina na vida e também sacrifícios e “cruzes”. O exercício do jejum deve ser um auxílio para a nossa conversão a Deus.
b) A esmola: com este conceito, entendemos toda forma de caridade e de solidariedade fraterna. Somos reconhecidos como cristãos através do amor a Deus e ao próximo; mas a tentação do egoísmo e do fechamento diante das necessidades do próximo é grande! A Quaresma nos estimula na prática das obras de misericórdia; sobre elas deveremos, um dia, responder diante de Deus: “eu tive fome... tive sede... estava sem roupa, sem casa, na prisão, doente...” (cf Mt 25). A Campanha da Fraternidade, cada ano, nos propõe um aspecto da vivência da caridade e da solidariedade fraterna. Neste ano, é a questão da saúde pública.
c) A oração é o 3º exercício quaresmal e este conceito envolve nossa comunhão e familiaridade com Deus, nas quis devemos crescer e nos aprofundar ao longo da vida. Não existe vida cristã, sem comunhão com Deus e esta se traduz na escuta atenta e assídua da Palavra de Deus, na oração pessoal e comunitária e na vivência da “amizade com Deus”. O cristão não é um estranho a Deus, mas um filho de Deus; bom filho não esquece do pai nem fica longe, sem ligar para ele...
Este é um tempo abençoado, um “tempo favorável”. Comecemos logo os exercícios da Quaresma e nos exercitemos neles cada dia, respondendo ao convite de Jesus, ouvido na Quarta Feira de Cinzas: “Convertei-vos e crede no Evangelho”. Rezemos mais intensamente; acolhamos a Palavra de Deus com atenção; façamos obras de penitência, cujo fruto será a conversão mais profunda a Deus e a alegria pascal.

Publicado no "Povo de Deus", folheto litúrgico da Arquidiocese , no 1º domingo da quaresma
São Paulo, 26.02.2012
Cardeal Odilo Pedro Scherer 
Arcebispo de São Paulo
@DomOdiloScherer

Sete Dicas Espirituais para a Quaresma



Nos mais de 10.000 grupos de oração da RCC cadastrados em todo o Brasil¹, a música “Eu navegarei” é muito conhecida e cantada. Um trecho específico do refrão sempre me toca:

Espírito, Espírito!
Que desce como fogo
Vem como em Pentecostes
E enche-me de novo!

Sempre ressoa dentro de mim: “De novo! Outra vez, Senhor! Mais uma vez! Vem!” É a experiência do “de novo e sempre novo”, que só o Espírito pode realizar no ser humano.
Dom Alberto Taveira inicia maravilhosamente seu Retiro Popular 2012 com uma ideia simples mas inspirada e inspiradora:

A QUARESMA É ANTIGA E NOVA.

Como fundamentação desta moção espiritual, o arcebispo de Belém cita o Evangelho de Mateus, capítulo 13, versículo 52:

Por isso, todo escriba instruído nas coisas do Reino dos céus é comparado
a um pai de família que tira de seu tesouro coisas novas e velhas.

Eu já citei aqui (http://eutenhodeusedeusmetem.blogspot.com/2011/12/ainda-da-tempo-de-viver-o-advento.html) o nº 185 do YouCat, Catecismo Jovem da Igreja Católica, que explica o porquê da repetição anual da Liturgia, mas vale a pena destacar de novo:

"Tal como anualmente celebramos o dia do nosso nascimento, ou de casamento, também a Liturgia celebra, a um ritmo anual, os mais importantes acontecimentos salvíficos do Cristianismo. Todavia, com uma diferença decisiva: todo tempo é tempo de Deus. Memórias da mensagem e da vida de Jesus são simultaneamente encontros com o Deus vivo. O filósofo dinamarquês Sören Kierkgaard disse uma vez: << Ou somos contemporâneos de Jesus, ou é melhor deixar isso.>> Acompanhar fielmente o Ano Litúrgico faz-nos, efetivamente, contemporâneos de Jesus. Não porque entramos com o nosso pensamento ou até todo nosso ser no Seu tempo e na Sua vida, mas porque Ele, quando lhe dou espaço, entra no meu tempo e na minha vida com a sua presença que cura e perdoa, com a força explosiva da Sua ressurreição."

Jochen Klepper (1903 – 1942, escritor alemão) afirma que a repetição dos acontecimentos do Ano Litúrgico é a maior obra de arte da humanidade e que Deus é favorável a esta experiência antiga e nova, ao ponto de nos conceder tal vivência a cada ano “numa luz sempre nova, como se fosse a primeira vez”.
De fato, a experiência de todos os anos, graças ao Espírito Santo, pode ser totalmente nova! Mesmo as práticas mais tradicionais ganham um dinamismo novo em tempos fortes, pois quando o Espírito de Deus envia o seu sopro, se renova toda a face da terra. (Salmo 103, 30).
Nesta primeira semana da Quaresma, devemos aproveitar a oportunidade que o Senhor nos concede de adentrar o deserto com Ele por 40 dias. Nesta perspectiva, poderemos encarar esse desafio de duas formas, como analisa o Papa Bento XVI na Mensagem do Angelus do 1º Domingo da Quaresma/2012:

O deserto (...) há diversos significados, pode indicar o estado de abandono e de solidão, o “lugar” da fraqueza do homem onde não há apoios e seguranças, onde a tentação se faz mais forte. Mas pode indicar também um lugar de refúgio e abrigo, como foi para o povo de Israel escapar da escravidão egípcia, onde se pode experimentar, de modo particular, a presença de Deus.

Para que nossa experiência quaresmal seja “novidade de vida”, seja esse “refúgio e abrigo” no deserto na presença de Jesus, compartilho aqui 7 ‘dicas espirituais’ para a nossa vivência da Quaresma 2012:

26 de fevereiro de 2012

AS TENTAÇÕES DE JESUS


TEMPO DA QUARESMA. PRIMEIRO DOMINGO



– O Senhor permite que sejamos tentados para que cresçamos nas virtudes.
– As tentações de Jesus. O demônio prova-nos de maneira semelhante.
– O Senhor está sempre ao nosso lado. Armas para vencer.
I. “A QUARESMA COMEMORA os quarenta dias que Jesus passou no deserto, como preparação para esses anos de pregação que culminam na Cruz e na glória da Páscoa. Quarenta dias de oração e de penitência que, ao findarem, desembocam na cena que a liturgia de hoje oferece à nossa consideração no Evangelho da Missa: as tentações de Cristo (cfr. Mt IV, 1-11). É uma cena cheia de mistério, que o homem em vão pretende entender – Deus que se submete à tentação, que deixa agir o Maligno –, mas que pode ser meditada se pedirmos ao Senhor que nos faça compreender a lição que encerra”1.
É a primeira vez que o demônio intervém na vida de Jesus, e fá-lo abertamente. Põe à prova Nosso Senhor; talvez queira averiguar se chegou a hora do Messias. Jesus deixa-o agir para nos dar exemplo de humildade e para nos ensinar a vencer as tentações que sofreremos ao longo da nossa vida: “Como o Senhor fazia todas as coisas para nos ensinar – diz São João Crisóstomo –, quis também ser conduzido ao deserto e ali travar combate com o demônio a fim de que os batizados, se depois do batismo sofrem maiores tentações, não se assustem com isso, como se fosse algo de inesperado”2. Se não contássemos com as tentações que temos de sofrer, abriríamos a porta a um grande inimigo: o desalento e a tristeza.
Jesus quis ensinar-nos com o seu exemplo que ninguém deve considerar-se dispensado de passar por provas. “As tentações de Nosso Senhor – diz Knox – são também as tentações dos seus servidores individualmente. Mas, como é natural, o grau é diferente: o demônio não nos oferecerá a vós e a mim todos os reinos do mundo. Conhece o mercado e, como bom vendedor, oferece exatamente o que calcula que o comprador quererá. Suponho que pensará, com bastante razão, que quase todos nós podemos ser comprados por cinco mil libras por ano, e muitos de nós por muito menos. Também não nos oferece as suas vantagens de modo tão aberto, antes envolve as suas ofertas em toda a espécie de formas plausíveis. Mas se vê a menor oportunidade, não demora muito em mostrar-nos como podemos conseguir aquilo que queremos, se concordamos em ser infiéis a nós mesmos e, muitas vezes, à nossa fé católica”3.

Quaresma: Tempo de trabalhar nosso relacionamento com Deus


Angelus do Papa Bento XVI – 26/02/2012


Queridos irmãos e irmãs!

Neste primeiro domingo de Quaresma, encontramos Jesus que, depois de ter recebido o batismo no Rio Jordão, por meio de João Batista (cfr Mc 1,9), é tentado no deserto (cfr Mc 1,12-13).

A narração de São Marcos é concisa, priva dos detalhes que lemos nos outros dois Evangelhos de Mateus e de Lucas. O deserto do qual fala há diversos significados, pode indicar o estado de abandono e de solidão, o “lugar” da fraqueza do homem onde não há apoios e seguranças, onde a tentação se faz mais forte. Mas isso pode indicar também um lugar de refugio e abrigo, como foi para o povo de Israel escapar da escravidão egípcia, onde se pode experimentar, de modo particular, a presença de Deus. Jesus, no deserto, “esteve quarenta dias, tentado pelo demônio” (Mc 1,13).

São Leão Magno comenta que “o Senhor quis sofrer o ataque do tentador para defender com sua ajuda e ensinar pelo seu exemplo” (Tractatus XXXIX,3 De ieiunio quadragesimae: CCL 138/A, Turnholti 1973, 214-215).

O que pode nos ensinar este episódio? Como lemos no livro Imitação de Cristo, “o homem nunca é totalmente livre da tentação, até o fim da vida... Mas com paciência e verdadeira humildade, se tornará mais forte do que qualquer inimigo” (Liber I, c. XIII Cidade do Vaticano 1982, 37); a paciência e a humildade de seguir todos os dias o Senhor, aprendendo a construir a nossa vida não sem Ele ou como se Ele não existisse, mas Nele e com Ele, porque é a fonte da verdadeira vida.

A tentação de remover Deus, conduzindo as coisas no mundo, contando apenas com suas próprias habilidades, está sempre presente na história do homem.

Jesus proclama que “o tempo se cumpriu e o reino de Deus está próximo” (Mc 1,15), anuncia que Nele acontece algo novo: Deus se fez homem, de modo inesperado, com uma proximidade única e concreta, plena de amor; Deus se encarna e entra no mundo como homem e pega para si o pecado, para vencer o mal e reconduzir o homem ao mundo de deus.

Mas este anúncio é acompanhado por uma exigência: corresponder a esse dom tão grande. Jesus, de fato, acrescenta: “convertei-vos e crede no evangelho” (Mc 1,15); é o convite a ter fé em Deus e a converter todos os dias nossa vida a Sua vontade, orientando, para o bem, cada ação nossa e cada pensamento.

O tempo da Quaresma é um momento propício para renovar e melhorar o equilíbrio do nosso relacionamento com Deus, por meio da oração cotidiana, os gestos de penitência e as obras de caridade fraterna. 

Supliquemos com fervor a Maria Santíssima para que acompanhe o nosso caminho quaresmal com sua proteção e nos ajude a imprimir em nosso coração e em nossa vida a Palavra de Jesus Cristo, para convertermos a Ele. Confio, por fim, as vossas orações pela semana de exercícios espirituais que iniciarei nesta noite junto aos meus colaboradores da Cúria Roma.

 
 

A LITURGIA NA QUARESMA EXIGE SILÊNCIO E SOBRIEDADE






Uma liturgista da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) destaca que a liturgia na Quaresma deve ser permeada de silêncio e sobridade.

Para celebrar profundamente a Quaresma --que se estende da Quarta-feira de Cinzas até a manhã da Quinta-feira Santa--, Ir. Veronice Fernandes, pddm, faz algumas indicações, em texto difundido via internet pelo projeto «Liturgia em Mutirão», da CNBB.

Ela recorda primeiramente que a oração, o jejum e a solidariedade devem ser intensificados.
Também «o espaço litúrgico seja despojado e sóbrio. Os vazios e as ausências nos ajudam a esvaziar o coração para preenchê-lo com a Palavra, que é luz para nossos passos e que nos converte», afirma.

Ir. Veronice Fernandes destaca ainda que momentos de silêncio, «principalmente entre as leituras e após a homilia, são importantes».

A cor litúrgica para a Quaresma é a roxa – explica a religiosa –, que expressa a dimensão maior de penitência e disposição à conversão.

«Um sinal permanente no espaço litúrgico, como um tecido roxo em forma de faixa na mesa da Palavra ou como detalhe na mesa eucarística», mas sem «tampar» ou «esconder» o altar, «ajudará na experiência quaresmal.»

A religiosa indica também que «a cruz, pela qual fomos marcados no Batismo, deve ser destacada».
«Ela lembra que somos discípulos e discípulas de Jesus, que superou o fracasso humano da cruz com um amor que vence a morte. Nas celebrações do Ofício de vigília, aos sábados, no momento do canto de abertura, pode ser feita a iluminação da cruz. É preciso também valorizá-la nas celebrações dominicais.»
Sobre os cantos e melodias, a religiosa afirma que eles «expressam o sentido próprio do mistério celebrado».

«Por isso, cuide-se para que não apenas deixem de ser cantados o Glória e o Aleluia, mas que, tanto no conteúdo quanto no ritmo e no uso dos instrumentos, eles sejam uma verdadeira expressão da Quaresma», escreve.

Por Alexandre Ribeiro in Site zenit.org

7 de fevereiro de 2012

Mensagem do Papa para Quaresma de 2012




«Prestemos atenção uns aos outros, para nos estimularmos ao amor e às boas obras»
(Heb 10, 24)


Mensagem do Papa Bento XVI para a Quaresma de 2012


Irmãos e irmãs!
A Quaresma oferece-nos a oportunidade de refletir mais uma vez sobre o cerne da vida cristã: o amor. Com efeito este é um tempo propício para renovarmos, com a ajuda da Palavra de Deus e dos Sacramentos, o nosso caminho pessoal e comunitário de fé. Trata-se de um percurso marcado pela oração e a partilha, pelo silêncio e o jejum, com a esperança de viver a alegria pascal.
Desejo, este ano, propor alguns pensamentos inspirados num breve texto bíblico tirado da Carta aos Hebreus: «Prestemos atenção uns aos outros, para nos estimularmos ao amor e às boas obras» (10, 24). Esta frase aparece inserida numa passagem onde o escritor sagrado exorta a ter confiança em Jesus Cristo como Sumo Sacerdote, que nos obteve o perdão e o acesso a Deus. O fruto do acolhimento de Cristo é uma vida edificada segundo as três virtudes teologais: trata-se de nos aproximarmos do Senhor «com um coração sincero, com a plena segurança da » (v. 22), de conservarmos firmemente «a profissão da nossa esperança» (v. 23), numa solicitude constante por praticar, juntamente com os irmãos, «o amor e as boas obras» (v. 24). Na passagem em questão afirma-se também que é importante, para apoiar esta conduta evangélica, participar nos encontros litúrgicos e na oração da comunidade, com os olhos fixos na meta escatológica: a plena comunhão em Deus (v. 25). Detenho-me no versículo 24, que, em poucas palavras, oferece um ensinamento precioso e sempre atual sobre três aspectos da vida cristã: prestar atenção ao outro, a reciprocidade e a santidade pessoal.
1. «Prestemos atenção»: a responsabilidade pelo irmão.